01 fevereiro, 2010

Os homens sem escrúpulos

Vi esta já não sei onde. Mas vale a pena ler...
Define a geração que domina o poder. Cá e noutros lados não muito distantes...

Os homens sem escrúpulos

Ivaldo Roland


Nós somos os homens sem escrúpulos.
Vivemos pelo fausto deslumbrados e ávidos por tudo beneméritos, mas somos da verdade sempre esquivos, aqueles da mentira sempre dúbios.
Infortúnio é somente o descuido, quando escroques nos revela de pronto.
Sem índole, sem remorso, sem pena, sem dor, sem brio, sem honra.
Mesquinhos e venais, obtemos o que queremos por qualquer meio escuso.
Nós somos os homens sem escrúpulos.
Nosso caminho funda-se e é respaldo da universal infâmia. O vácuo como essência. O ar solene abraçamos, mas sob o ouro da arrogância não há nada.
Aqui é a terra dos homens sem escrúpulos, aqui a ética não brota.
O jardim que a aparência esmera, do mal miméticas flores cultiva.
Enquanto movem-se espectrais pelo cinismo, riso por nossas bocas desditas.
E na ânsia pelo lucro indevido funesto regozijo habita:
O sucesso a qualquer custo, nada mais importa.
Somos o aborto da ganância.
Nossa real emoção caracterizam as cifras.
O malefício em nós impregnados, palavras inexpressas o perfil proclama, sua inumerável face:
Corruptos de toda ordem para todos os fins.
Bajuladores e outros mentirosos. Farsantes. Plagiadores. Grileiros. Contrabandistas.
Estelionatários. Fraudadores.Perversores. Perniciosos.
Certos senhores da justiça que fazem da verdade o ermo.
Criminosos de toda espécie. Tiranos. Falsos democratas, os que vêm mérito em governar miséria. Aparentamos tantos e somos os mesmos, somos os homens sem escrúpulos.
Quando poderosos, mais inescrupulosos somos, avessos a qualquer virtude escassa, e usufruimos da facilidade porque nos servem gente lacaia.
Condição que se esmera substantiva do próprio degrado nos mais desprezíveis da terra.
E mais servis são pelas migalhas que nossa vilã soberba lhes amassa.
Por isso também sem brio, sem honra, sem pena, sem dor, sem índole, sem remorso.
E na baixeza dos meios empregados, somos execráveis de todo, somos de todo falsos ilustres.
Nós, lacaios e poderosos, somos iguais inescrupulosos de mesma escória formados, idênticos vazios de alma.
Somos todos vis de mesma laia! Ao suborno dos responsáveis, das cidades infringimos os códigos, sem que se saiba o mal que causamos e a hipocrisia veicula como numa alusão a pródigos; das terras nos apropriamos; poluímos o ar e a água; extinguimos os índios e devastamos florestas, causamos a fome de milhares e injúria ao lesar tesouros
E o ludíbrio das pátrias.
Somos tais os carentes do amor de mãe, também do valor do próprio pai, como os párias sem culpa, tampouco são como nós somos, frios de mau caráter, em todas as línguas de igual significado:
Somos os autênticos filhos da pu..a!

Mário Crespo - No comments


O Fim da Linha
Mário Crespo
Terça-feira dia 26 de Janeiro. Dia de Orçamento. O Primeiro-ministro José Sócrates, o Ministro de Estado Pedro Silva Pereira, o Ministro de Assuntos Parlamentares, Jorge Lacão e um executivo de televisão encontraram-se à hora do almoço no restaurante de um hotel em Lisboa.
Fui o epicentro da parte mais colérica de uma conversa claramente ouvida nas mesas em redor. Sem fazerem recato, fui publicamente referenciado como sendo mentalmente débil (“um louco”) a necessitar de (“ir para o manicómio”). Fui descrito como “um profissional impreparado”. Que injustiça. Eu, que dei aulas na Independente. A defunta alma mater de tanto saber em Portugal. Definiram-me como “um problema” que teria que ter “solução”. Houve, no restaurante, quem ficasse incomodado com a conversa e me tivesse feito chegar um registo. É fidedigno. Confirmei-o. Uma das minhas fontes para o aval da legitimidade do episódio comentou (por escrito): “(…) o PM tem qualidades e defeitos, entre os quais se inclui uma certa dificuldade para conviver com o jornalismo livre (…)”.
É banal um jornalista cair no desagrado do poder. Há um grau de adversariedade que é essencial para fazer funcionar o sistema de colheita, retrato e análise da informação que circula num Estado. Sem essa dialéctica só há monólogos. Sem esse confronto só há Yes-Men cabeceando em redor de líderes do momento dizendo yes-coisas, seja qual for o absurdo que sejam chamados a validar. Sem contraditório os líderes ficam sem saber quem são, no meio das realidades construídas pelos bajuladores pagos. Isto é mau para qualquer sociedade.
Em sociedades saudáveis os contraditórios são tidos em conta. Executivos saudáveis procuram-nos e distanciam-se dos executores acríticos venerandos e obrigados. Nas comunidades insalubres e nas lideranças decadentes os contraditórios são considerados ofensas, ultrajes e produtos de demência.
Os críticos passam a ser “um problema” que exige “solução”. Portugal, com José Sócrates, Pedro Silva Pereira, Jorge Lacão e com o executivo de TV que os ouviu sem contraditar, tornou-se numa sociedade insalubre. Em 2010 o Primeiro-ministro já não tem tantos “problemas” nos media como tinha em 2009. O “problema” Manuela Moura Guedes desapareceu. O problema José Eduardo Moniz foi “solucionado”. O Jornal de Sexta da TVI passou a ser um jornal à sexta-feira e deixou de ser “um problema”. Foi-se o “problema” que era o Director do Público. Agora, que o “problema” Marcelo Rebelo de Sousa começou a ser resolvido na RTP, o Primeiro Ministro de Portugal, o Ministro de Estado e o Ministro dos Assuntos Parlamentares que tem a tutela da comunicação social abordam com um experiente executivo de TV, em dia de Orçamento, mais “um problema que tem que ser solucionado”. Eu. Que pervertido sentido de Estado. Que perigosa palhaçada.
Nota: Artigo originalmente redigido para ser publicacado hoje (1/2/2010) na imprensa.