Esta entrvista completa está no Expresso on-line:
http://expresso.clix.pt/Actualidade/Interior.aspx?content_id=395273
Porque é que um liberal há vinte anos sente que hoje o liberalismo já não é solução?
Porque o mundo mudou. Hoje há um fenómeno de globalização completamente incontornável e houve fenómenos que vão ao arrepio daquilo que se pensava que pudesse ser a evolução da sociedade. Hoje há mais ricos e há mais pobres. Há um fosso maior entre ricos e pobres, entre países ricos e pobres. Há uma ideologização do sucesso pelo sucesso, de que o dinheiro é o único valor, coisas com as quais eu não posso concordar.
Normalmente quem diz isso é quem teve sucesso e tem dinheiro…
Normalmente quem diz isso é quem teve sucesso e tem dinheiro…
Normalmente quem tem este discurso é a esquerda. Eu ouvi Mário Soares dizer isto no discurso dos 34 anos do PS – que não se podia rever numa sociedade assim em que o dinheiro é que comanda e motiva as pessoas. Eu concordo com ele.
Hoje que rótulo lhe serve?
Hoje que rótulo lhe serve?
Tenho alguma dificuldade, porque tenho tido uma evolução um pouco sui generis. Eu acho que a direita muitas vezes tem pecado por três circunstâncias com as quais eu não me posso identificar. A direita não tem tido uma preocupação solidária, muitas vezes tem uma atitude anti-social; tem sido muitas vezes avessa à modernidade; e muitas vezes não é tolerante. Eu não me identifico com esse tipo de atitude da direita. Por exemplo, tenho dificuldade em aceitar algo como o Compromisso Portugal. É uma visão da sociedade de quem não anda com os pés assentes na terra. Todas essas teorias da revolução liberal cairiam se essas pessoas saíssem dos seus escritórios e das suas consultoras bem instaladas e passassem uma semana no Hospital de São José, a ver o que é a pobreza, ou se fossem à Pampilhosa da Serra ver o que é a desertificação, o Interior. Existem dois milhões de pessoas em Portugal que vivem abaixo de 60% da média nacional, há cerca de 21% da sociedade portuguesa que vive em risco de pobreza, e 15% há mais de dois anos, e as crianças e os idosos são os mais afectados. Contra estes fenómenos todos eu não acho que seja possível substituir o Estado. A primeira preocupação do Estado tem que ser responder a estes fenómenos de extrema injustiça e pobreza, que é crescente em Portugal. Num país como o nosso o Estado não pode deixar de ter uma intervenção que é insubstituível.
O que está a dizer é que não se pode confiar no mercado para resolver esses problemas. Mas mesmo os liberais admitem que o Estado crie uma rede de segurança que previna situações extremas…
Estou a falar de mais do que isso. Acho que o Estado é insubstituível em dois domínios fundamentais. Primeiro, dar alguma segurança e garantia relativamente aos direitos adquiridos em termos de pensão de reforma. Hoje vive-se em Portugal um sentimento novo, o receio generalizado das pessoas ao ver que aquilo que era intocável pode ser tocado – as pensões de reforma. Depois, a saúde. Há que ter a noção que o nosso sistema não é tão mau quanto o pintam, mas pode ser melhor, e é a única forma de dar um mínimo de segurança em termos de saúde às pessoas que não têm outros meios. Eu costumo dizer que estou aqui porque sou rico, se não fosse rico tinha morrido com o [problema de saúde] que tive. Mesmo admitindo que algumas coisas têm que mudar para salvar o essencial, não tenho dúvidas nenhumas que num país como o nosso uma concepção liberal seria uma catástrofe social, por isso não acredito nesses discursos que são muito sedutores, muito retóricos, mas que não têm nada a ver com a realidade.
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