Um pouco tarde (mas mais vasle tarde que nunca, lá diz o ditado) mas parece que Pacheco Pereira começou a abrir os olhos para a realidade que se antevê a médio prazo como resultado das medidas de cariz economicista tomadas pelo Ministério de Lurdes Rodrigues. E aqui, Pacheco faz incidir a sua objectiva em apenas um dos muitos aspectos desse grande desiderato socretino: a verdadeira desqualificação do ensino.
O afastamento dos profissionais do ensino mais qualificados (em termos científicos, pelo menos, aqueles que tiveram uma formação adequada e exigente de há bastantes anos, e não aqueles que como frangos de aviário foram formados em escolas ditas superiores de educação, pré-bolonhesas, ou os que virão dessas bolonhesices, cheios de teorias pedagógicas de como ensinar, mas que não sabem o que ensinar pois não têm formação científica capaz para o que quer que seja) é o grande desiderato deste governo que nos desgoverna.
E não apenas porque são mais competentes, mais "refilões", mais conhecedores do sistema, que sabem onde meter o "pauzinho" para encravar o dito cujo. Não, é porque também são caros... E para a educação e conhecimentos que o governo (e os políticos neo-liberais) pretende transmitir e fornecer à sociedade são demasiado caros. Uma coisinha assim "light" basta. Não é preciso muito conhecimento... só umas luzinhas... Por isso, e para isso um professor baratinho chega e sobra (veja-se a criação do super-professor para o 2º ciclo... só para acabadinhos de formar e no início de carreira, logo... "baratinhos"....).
Agoram digam que não é meramente economicismo.... E os "velhotes" que se cuidem... quando entrar a gestão profissional nas escolas, gestão por objectivos, níveis de proficiência, eficiência e rendibilidade, aí é que vai ser o bom e o bonito.
DA RETÓRICA MACRO (DAS "REFORMAS") À REALIDADE MICRO:O CASO DAS ESCOLAS E DOS PROFESSORES (4)
Uma mera observação do mecanismo dessas escolhas mostra que estão feitas para, a prazo, afastar do sistema escolar os professores que dão aulas há mais anos e que são, por norma, os mais qualificados. Como muitos aspectos da reforma da função pública, que foram feitos á pressa e apenas para poupar dinheiro, corre-se o risco de estar a desertificar a função pública do seu know-how mais especializado, do seu capital de experiência. Isto é muito bonito na retórica, mas na prática quem está a apanhar com a ameaça de despedimento a prazo, são os mais velhos, os mais experientes, os que tem maior currículo e saber.
Não se trata de fazer eco da resistência sindical às mudanças que tanto favoreceu a fragilidade dos professores face ao Ministério. Trata-se de casos em que os professores têm pura e e simplesmente razão para se sentirem injustiçados e as reformas podem ter um efeito perverso de agravarem a qualidade do ensino ao empobrecerem a quantidade de "saber" existente dentro das escolas.
(O sublinhado é meu)
Não resisto a reproduzir um comentário deixado pelo leitor Paulo Agostinho no Abrupto a propósito deste tema. Comentário arguto e perspicaz. (Não lhes pedi autorização, mas por uma boa causa acredito que não se importarão):
A última tendência (talvez se justificasse o plural, pois foram tantas em tão pouco tempo) da política educativa portuguesa teve várias consequências, já abordadas no Abrupto. Em primeiro lugar, há uma desvalorização da formação científica dos professores em detrimento da formação "pedagógica". Por esse motivo se abordou a hipótese de colocar mestres em ciências da educação a leccionar várias disciplinas. Mesmo não tendo um sólido conhecimento científico na área das disciplinas que váo leccionar. Há pessoas no ministério que acreditam que o importante é saber "ensinar a aprender", "guiar" os alunos na "descoberta e na construção dos saberes e na aquisição de competências." Como se fosse possível ensinar no vazio.
A desvalorização da formação científica é bem notória nos currículos dos cursos da área de educação (Escolas Superiores e algumas Universidades). Neles, o peso das cadeiras científicas é menor do que nos currículos das universidades tradicionais e o das cadeiras dedicadas às ciências da educação, pedagogias, didácticas e afins é muito maior. O resultado é óbvio: professores que (teoricamente) sabem ensinar, mas que não sabem o que ensinar. E este aspecto tem consequências até a nível disciplinar: quando um professor se mostra inseguro do seu conhecimento ou revela mais do que uma vez falhas que os alunos detectem, começa a ser posto em causa. Perde autoridade, ganha fama de inseguro ou mesmo de incompetente.
Os alunos ainda acreditam que os professores devem saber tudo e não aceitam bem um professor que não saiba muita coisa).
A pior consequência, porém, verifica-se a longo prazo. À medida que os professores com mais conhecimentos científicos vão abandonando o ensino (pela idade ou porque simplesmente optam por outra via profissional onde sejam mais valorizados), ficam os outros. Que ensinam menos, por muita vocação que possam ter. E são alunos pior preparados que começa(ra)m a chegar ao ensino superior. E de lá sairão para ensinar também. O ciclo torna-se vicioso e difícil de travar, com graves custos para o país.
1 comentário:
Mais um artigo correctíssimo. Na minha área há muitos já assim que nada ou quase nada sabem da matéria que leccionam mas que por causa da valorização que dão à pedagogia passam à frente dos que andaram oito e mais anos a formarem-se numa área científica. Também para o que os alunos querem aprender o que mais convém é sabê-los entreter.
Enviar um comentário